quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Muito ruído no Oceano!...

A consequência negativa mais conhecida da acidificação (diminuição do pH) dos oceanos é a diminuição da quantidade de carbonato de cálcio disponível. Mas existem muitas outras, algumas surpreendentes. Como por exemplo a alteração das características de propagação do som. A acidificação está a aumentar o ruído de fundo dos oceanos!

Á medida que se tornam mais ácidos, os oceanos vão perdendo a capacidade para absorver sons de baixa frequência (abaixo de 10 000 Hz). Estima-se que desde o início da Revolução Industrial até hoje o pH da água do mar desceu (em média) 0,1. Esta descida terá sido responsável por uma perda de 10% da capacidade da água do mar para absorver sons de baixa frequência. Até 2050 a perda poderá ser de 40% (correspondente a uma diminuição de pH de 0,3).
O gráfico da figura seguinte apresenta a variação da absorção de som em função da frequência para diferentes valores de pH da água do mar. Quanto menor o valor de pH menor a capacidade da água do mar para absorver sons de baixa frequência. A capacidade para absorver sons de frequência superior a 20 000 Hz quase não diminui. (Crédito: Hester et all, 2008)

No oceano existem muitas fontes de som. As fontes naturais mais importantes são as ondas geradas pelo vento, a chuva e o movimento dos animais marinhos. As fontes antropogénicas (geradas por actividade humana) mais importantes são os navios e os sonares marítimos

A diminuição da absorção de sons de baixa frequência poderá ter consequências desastrosas para os animais marinhos que, como os golfinhos e as baleias, dependem da ecolocalização para se alimentarem e comunicarem entre si. Com o aumento do ruído de fundo torna-se cada vez mais difícil para estes animais distinguir (filtrar) e interpretar os sons de baixa frequência.

A figura seguinte explica de forma simples o sistema de ecolocalização utilizado pelos golfinhos. O animal emite um som (representado pelas linhas a cheio) sob a forma de cliques de pequena duração em sequência. O som emitido pelo golfinho propaga-se pela água até atingir o alvo, neste caso um peixe (alimento). Quando atinge o peixe parte do som é reflectido (representado pelas linhas a tracejado) de volta para o golfinho.


O sistema de ecolocalização permite ao golfinho determinar não só o tamanho e a forma do peixe como também a distância a que este se encontra e a sua velocidade. Este sistema utiliza sons de baixa frequência porque estes propagam-se na água do mar (ou em qualquer outro meio de propagação) durante mais tempo, e portanto “percorrem” maiores distâncias.

Não se conhece ainda bem o mecanismo responsável pela absorção de sons de baixa frequência nos oceanos. Sabe-se que estão envolvidos alguns solutos, como o sulfato de magnésio, o ácido bórico, o ião carbonato e o ião de cálcio. A temperatura da água do mar também é importante: se, como é esperado, a temperatura média do mar aumentar devido ao efeito de estufa a capacidade para absorver sons de baixa frequência será ainda menor.



Nota (1): Actualmente são conhecidos casos em que o aumento de ruído de fundo provocou a alteração do comportamento de cetáceos (baleias e golfinhos). Estão documentados vários casos destes na sequência de exercícios militares navais em que são utilizados sonares (sistemas que funcionam como radares, de forma semelhante à da ecolocalização dos golfinhos).

Nota (2): A diminuição do pH da água do mar também provoca o aumento da velocidade de propagação do som. Uma diminuição de pH de 0,1 (correspondente à variação mos últimos 200 anos, desde o início da Revolução Industrial) deverá ser responsável por um aumento de 10% da velocidade do som nos mares, segundo investigadores do Montery Bay Aquarium Recharch Institute, ou MBARI. Até 2050 estes investigadores estimam que a velocidade de propagação do som na água do mar possa aumentar até 70%.

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