sábado, 29 de outubro de 2011

Inúmeras Terras espalhadas pelo Universo

Investigadores da Universidade de Leiden, Holanda, olharam através da Sonda Espacial Herschel para a estrela TW Hydrae, situada a 175 anos-luz da Terra, e verificaram que esta apresenta um disco protoplanetário com água suficiente para milhares de Terras. Os seus resultados foram apresentados num artigo publicado este mês pela revista Science.

A figura seguinte é uma representação artística da TW Hydrae, rodeada pelo disco protoplanetário. O disco tem uma extensão de 200 UA (unidade astronómica, 1 UA = distância média da Terra ao Sol). A zona onde foi descoberta água encontra-se a azul (Crédito: ESA/NASA/JPL-Caltech).

 
A TW Hydrae é uma estrela jovem, com perto de 10 milhões de anos (muito pouco quando comparado com os 4,5 biliões de anos do “nosso” Sol). É parecida com o Sol mas mais leve (0,7 massas solares) e situa-se na constelação de Hydrae, a serpente marinha, representada na figura seguinte.


A volta da estrela TW Hydrae existe um disco protoplanetário, um disco constituído por poeira e gases em rotação à volta da estrelas. Os astrónomos consideram que o disco em torno da TW Hydrae corresponde aos primórdios da formação do sistema solar e irá (daqui a milhões de anos) tornar-se num sistema planetário semelhante ao nosso.

A Sonda Espacial Herschel detectou a existência de quantidades muito reduzidas de vapor de água no disco protoplanetário da TW Hydrae, através da análise de espectros de emissão como o apresentado na figura em baixo. A análise destes espectros indicia que o vapor de água libertado se encontra a temperaturas muito baixas, perto de 100 K (≈ -173 ºC). Para estar a esta temperatura, o vapor de água tem de estar longe da estrela, nas zonas mais exteriores do disco protoplanetário (Crédito: ESA/NASA/JPL-Caltech/M. Hogerheijde).


A figura representa o espectro de emissão do disco protoplanetário da estrela TW Hydrae para de dois tipos de moléculas de água, chamados para-água (espectro a verde) e ortho-água (espectro a cor-de-rosa). É possível calcular a temperatura a que o vapor de água é emitido através da relação entre estes dois tipos de moléculas de água: quanto menor a percentagem de moléculas de ortho-água menor a temperatura do vapor de água.

Os investigadores consideram que nas zonas do disco protoplanetário a água se deposita como gelo sobre as poeiras. Com o tempo estas poeiras cobertas de gelo vão-se agregando, formando grandes blocos de gelo “sujo”, os cometas. Actualmente os cometas são vistos como fortes candidatos a fontes da água dos oceanos terrestres (ver aqui).

É muito provável a formação de muitos cometas no futuro sistema planetário da estrela TW Hydrae. Estes irão funcionar como fonte de água para os planetas recém-formados. Caso as estrelas e respectivos sistemas planetários sejam formados da mesma forma que a TW Hydrae, então é muito provável que existam espalhados pela Via Láctea e pelas outras galáxias inúmeros mundos, Terras cheias de Vida.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Cometas, fonte da água dos Oceanos

Elementos recolhidos pela sonda espacial Herschel indiciam que os cometas poderão ter sido contribuidores importantes de água para a Terra. A Herschel analisou a cabeleira do cometa Hartley 2, um cometa com origem na Cintura de Kuiper, e verificou que a água presente no cometa apresenta uma assinatura química semelhante à da água dos oceanos na Terra.

Em baixo uma fotografia do Hartley 2 tirada pelo satélite EPOXI a 4 de Novembro de 2011 (Crédito: NASA, JPL-Caltech, UMD, EPOXI Mission).


A água presente nos Oceanos não acompanha a Terra desde a sua origem. Aquando da sua formação, a Terra era árida e seca, com toda a água presente a evaporar e escapar-se da atmosfera terrestre. A água presente actualmente na Terra veio do espaço, alguns milhões de anos após a formação da Terra. Os investigadores consideram como melhores candidatos os asteróides (presentes na cintura de asteróides, entre Marte e Júpiter) e cometas.

Para determinar quais os melhores candidatos como fontes de água no Sistema Solar têm sido estudadas as assinaturas químicas da água presente em asteróides e cometas. Este estudo baseia-se no facto a assinatura química da água depender da sua fonte: amostras de água de fontes com origem comum (formadas na mesma zona do Sistema Solar) têm a mesma assinatura. A análise meteorito carbonáceos, uma classe de asteróides, revelou possuem água com uma assinatura química semelhante à dos Oceanos terrestres.

Até agora foi analisada a assinatura química da água libertada por seis cometas. Destes apenas a água presente no cometa Hartley 2 (o último a ser analisado) apresenta uma assinatura semelhante à água presente na Terra. O Hartley 2 é também o único cometa analisado que tem origem na cintura de Kuiper, a “apenas” 30 UA do Sol (unidades astronómicas, 1 UA = distância da Terra ao Sol). Os outros cinco cometas analisados têm origem na nuvem de Oort, situada muito mais longe, a um ano-luz do Sol (50 000 UA), no limite do sistema solar.

A origem diferente dos cometas leva os investigadores a concluir que os cometas com origem cintura de Kuiper (mas não os com origem na mais distante Nuvem de Oort) são potenciais candidatos a fontes de água terrestre.

A figura seguinte apresenta uma figura indicando as escalas relativas de parte do sistema solar (mais à esquerda), da cintura de Kuiper (onde se situam Plutão e os outros planetas anões) e da Nuvem de Oort (mais à direita). À esquerda estão representados os cinco planetas mais próximos do Sol (Júpiter é o planeta mais exterior). O traçado branco representa a órbita de 6,5 anos do cometa Hartley 2 em torno do Sol (Crédito: ESA/AOES Medialab).





Notas:

(1) A assinatura química da água é a razão entre a concentração de átomos de deutétio e átomos de hidrogénio. Uma molécula de água é constituída por dois átomos de hidrogénio e um de oxigénio. Ambos os elementos químicos (hidrogénio e oxigénio) apresentam isótopos, átomos com um núcleo com o mesmo número de protões, mas diferente número de neutrões. O hidrogénio apresenta três isótopos. O mais comum, chamado prótio, tem apenas um protão. Muito menos comuns são o deutério (constituído por um protão e um neutrão) e o trítio (constituído por um protão e dois neutrões).

A chamada “água pesada” (porque a massa de cada molécula é superior à massa de uma molécula de “água normal”) é constituída por moléculas em que um dos átomos de hidrogénio é substituído por um átomo de deutério, como se pode ver na figura seguinte, ao centro (Crédito: NASA/JPL-Caltech).


Esta figura apresenta a assinatura química da “água pesada” (gráfico azul em cima à esquerda) e da “água normal” (gráfico verde em baixo à esquerda), uma molécula de “água normal” (rodeada por um quadrado verde, a bola vermelha representa o átomo de oxigénio e as bolas cinzentas representam átomos de hidrogénio) e uma molécula de “água pesada” (rodeada por um quadrado azul, a bola azul representa o átomo de deutério). Em baixo à direita uma foto do cometa Hartley 2.

(2) Duas fontes interessantes (incluindo figuras): NASA e ESA.

domingo, 2 de outubro de 2011

Um ovo estrelado no céu nocturno

Os astrónomos do Observatório Europeu do Sul (European Southern Observatory ou ESO, no original) orientaram os quatro telescópios que compõem o Very Large Telescope para um ponto brilhante, mas invisível no céu e tiveram uma agradável surpresa: uma muito rara estrela hipergigante amarela, a estrela desta categoria mais próxima da Terra. As imagens recolhidas pelo VLT revelam uma grande estrela rodeada por duas camadas de matéria (libertada pela própria estrela). Os investigadores, inspirados por imagens como a de baixo, deram-lhe um novo nome, a nebulosa ovo estrelado (Crédito: ESO/E. Lagadec).


A nebulosa Ovo Estrelado era, até poucos dias, apenas conhecida pelo seu nome de catálogo, IRAS 17163-3907. Está situada a 13 000 anos luz da Terra, na direcção da constelação de Escorpião, é um dos astros mais brilhantes na região do infavermelho, com um brilho 500 000 maior que o do Sol. No entanto é quase invisível para os nossos olhos. Esta estrela foi identificada no céu nocturno em 1976 e estudada pela primeira vez em 1983, utilizando o satélite IRAS.

É possível que a “invisibilidade” da nebulosa Ovo Estrelado tenha sido responsável por estar esquecida durante tantos anos. Mas o novo estudo revela muita informação sobre esta nebulosa. A estrela propriamente dita tem um raio de 5 UA (unidade astronómica, 1 UA = distância do Sol à Terra), correspondente à distância média de Júpiter ao Sol. A camada mais exterior tem um diâmetro de 10 000 UA (ou seja 10 000 vezes a distância da Terra ao Sol) e poderia abarcar todos os planetas e planetas anões conhecidos do sistema solar.

As duas camadas quase esféricas que rodeiam a estrela da nébula Ovo Estrelado são constituídas por matéria (maioritariamente silicatos e gás) expelida pela estrela. O estudo conclui que nas últimas centenas de anos a estrela terá perdido perto de 4 vezes a massa do Sol.

A figura em baixo apresenta a constelação de Escorpião (Scorpius, no original em latim), onde está situada a nebulosa Ovo Estrelado. A posição da estrela é dada pelo círculo vermelho (Crédito: ESO/IAU/Sky & Telescope).


Hipergigantes amarelas como a nebulosa Ovo Estrelado são estrelas com pelo menos 10 vezes a massa do Sol, que estão a passar por uma fase de curta duração, de “apenas” alguns milhares de anos antes de se transformarem noutro tipo de estrela (em comparação pensa-se que o Sol existe há perto de 4,5 biliões de anos e se irá manter na sequência principal por mais 5 biliões de anos). Por isso as hipergigantes amarelas são muito raras. A “proximidade” da nebulos Ovo Estrelado permite um estudo mais cuidado, aumentando o conhecimento que temos actualmente sobre as hipergigantes amarelas.

Os resultados do estudo agora publicado apontam para que a nebulosa Ovo Estrelado expluda numa supenova num futuro próximo (astronomicamente falando). Nessa altura a estrela irá libertar todo o seu conteúdo, milhares de milhões de biliões de átomos de todos os elementos químicos, para o espaço mais próximo. E será (pelo menos durante algumas semanas) o astro mais brilhante do céu nocturno terrestre. Mas até lá… estará invisível, como na fotografia em baixo (a nebulosa encontra-se no centro!) (Crédito: ESO/Digitized Sky Survey 2).




Nota: O Observatório Europeu do Sul situa-se em Cerro Paranal no deserto Atacama, Chile, longe da poluição luminosa. A fotografia seguinte é uma fotografia panorámica, tirada a 21 de Dezembro de 2010, durante um eclipse lunar. A lua vermelha pode ser observada sobre um dos quatro telescópios que compoem o Very Large Telescope (que se pode traduzir como Telescópio Muito Grande), o sistema utilizado para estudar a nebulosa Ovo Estrelado.


Nesta fotografia é ainda possível ver o planeta Vénus à esquerda, ao fundo. Vénus está rodeado por uma luz brilhante, conhecida como luz zodiacal. A luz zodiacal é visível principalmente em regiões com pouca poluição luminosa, em noites de Lua Nova e resulta da reflexão/dispersão da luz solar pela poeira presente em todo o Sistema Solar. O nome zodiacal é uma consequência de esta luz se apresentar apenas na zona da elíptica (a zona do céu nocturno das constelações do zodíaco). O arco de luz é um dos braços da via láctea (galáxia onde se encontra o Sistema Solar), visível no céu.