quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O protector solar da Lua

Quando a Lua é vista ao telescópio é possível ver em certas zonas umas manchas brancas onduladas, que se vão espalhando e desvanecendo. Estas manchas rodopiantes, chamadas remoinhos lunares, têm fascinado astrónomos amadores e profissionais e têm estado sem explicação. Até agora.

 
Os remoinhos lunares são áreas da superfície da Lua em que o albedo é menor (refletem mais a luz). Não são esquisitos na sua localização, existido em zonas com topografias muito diferentes, e podem estender-se por dezenas de quilómetros fazendo desenhos ondulantes sobre a superfície lunar. Mas tornam-se mais visíveis contra o fundo escuro dos mares, como prova a figura seguinte, uma fotografia de Reiner Gamma, um dos remoinhos lunares mais famosos, situado no Oceanus Procellarum (o maior dos mares lunares), perto da cratera Reiner, que lhe dá o nome. Na fotografia a cratera Reiner (com 30 km de diâmetro) situa-se em baixo à direita (Crédito: NASA).
 

 

Foram propostas várias hipóteses para a formação dos remoinhos lunares e para o seu baixo albedo. A mais importante baseia-se numa estranha coincidência: os remoinhos situam-se em zonas que apresentam uma “anomalia magnética”. Segundo esta hipótese, o campo magnético desta anomalia protegeria a zona da acção do vento solar.

 
O vento solar é libertado continuamente pelo Sol, atingindo todos os recantos do Sistema Solar. É constituído por protões, electrões e iões que se movem a grandes velocidades (em média de 400 km/s), o que o torna mortal para a Vida. A Terra, e outros planetas, produzem um campo magnético que desvia o vento solar. Mas a Lua não.

 
O vento solar é responsável pelo escurecer da superfície lunar. Segundo a hipótese favorita para a existência dos remoinhos lunares a superfície da Lua protegida pelas anomalias magnéticas não escurecia, mantendo um aspecto claro e “jovem”. O problema desta hipótese é que o campo magnético gerado pelas anomalias magnéticas é demasiado fraco para impedir a passagem do vento solar.

 
Este facto parece ter sido agora “ultrapassado” por um estudo publicado pela revista Physical Review Letters, que recria em laboratório as condições que ocorrem na Lua. Um pequeno íman é colocado sobre uma placa (que faz as vezes da superfície lunar) e são ambos submetidos à acção de vento solar “artificial”. Os resultados parecem espelhar o que acontece na Lua, de acordo com os dados recolhidos por sondas lunares.

 
As figuras seguintes mostram o que acontece à “superfície lunar” quando é sujeita à acção do vento solar no laboratório. O campo magnético é demasiado fraco para impedir ou desviar os protões e os iões. Mas os electrões seguem as linhas do campo magnético e são desviados. Isto provoca a separação entre a carga negativa (electrões) e a carga positiva (protões e iões), criando um campo eléctrico. É este campo eléctrico que desvia e repele de forma eficaz a grande maioria das partículas de carga positiva (os poucos que passam ajudam a manter o campo eléctrico).
 

 

A figura à esquerda é um esquema de como se forma e mantem um remoinho lunar. A figura à direita é o negativo de uma fotografia tirada em laboratório durante uma experiência com um íman sujeito à acção do vento solar. A barra preta é o “vento solar” e o campo eléctrico cria uma bolha protectora. Na Lua a bolha protectora criada pelo campo eléctrico pode atingir vários quilómetros de altura (Crédito: Bamford et al, Physical Review Letters).

 
Os resultados obtidos em laboratório estão de acordo com a informação recolhida pelas sondas espaciais que têm estudado a Lua, e com um modelo matemático desenvolvido pelos autores do estudo da Physical Review Letters. As ondulações visíveis na superfície lunar, que dão o nome ao fenómeno, são muito possivelmente provocadas pelo relevo do solo lunar.

 
Este estudo traz ainda a esperança de resolução de um dos problemas mais importantes na exploração espacial pelos humanos: como ultrapassar o efeito nefasto do sempre presente vento solar. A grande velocidade das partículas com carga torna-as fatais para todos os humanos que se atrevam a sair da “bolha protectora” formada pelo campo magnético gerado pela Terra. A exploração da Lua por astronautas é possível porque a “bolha protectora” também protege o nosso satélite natural. Mas a viagem até Marte é impossível sem uma protecção contra o vento solar.

 
O estudo da Physical Review Letters indicia que é possível criar uma “bolha protectora” em volta de uma nave espacial apenas com um campo magnético de baixa intensidade, de uma forma muito semelhante ao que acontece com os ondulantes remoinhos lunares. O efeito poderá ser igual ao que se pode ver na figura seguinte, uma fotografia de um pequeno íman sujeito à acção do vento solar (com um brilho púrpura) (Credito: RAL Space & Uni. of York).

 

Nota: O artigo da revista Physical Review Letters pode ser encontrado aqui.

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